sábado, 7 de junho de 2008

Escândalo inédito no Piratini

O presidente da CPI do Detran, Fabiano Pereira (PT), divulgou nesta sexta-feira a gravação de uma conversa mantida pelo vice-governador Paulo Feijó (DEM) e o chefe da Casa Civil, Cezar Busatto (PPS). O CD, gravado pelo próprio Feijó dia 26 de maio, foi repassado pelo vice-governador à deputada Stela Farias (PT), que o encaminhou ao presidente da CPI. A parlamentar foi taxativa: “a conversa é estarrecedora e revela o ‘modus operandi’ nefasto deste governo para construir maiorias políticas e financiar os partidos através de corrupção”, avaliou.
Fabiano Pereira classificou o momento de extremamente grave. Segundo ele, o diálogo mostra um modelo de fazer política que compromete as instituições democráticas e que “deve ser varrido da história do Estado”. O presidente da CPI quer que o secretário de Governo, Delson Martini, e o chefe da Casa Civil, Cezar Busatto, compareçam à comissão de inquérito já na próxima segunda-feira (9) para esclarecer os fatos. “Esperamos que venham não mais como secretários de Estado, mas como cidadãos comuns dar as explicações que devem à sociedade gaúcha”.
Pela primeira vez, o impedimento da governadora foi cogitado. Os deputados petistas acreditam que, a partir de agora, a responsabilidade da Assembléia aumenta. “Existem justificativas muito fortes para se pedir o impedimento da governadora”, sintetizou Stela.
O diálogo, ocorrido no Palacinho, sede de trabalho do vice-governador, foi iniciativa do chefe da Casa Civil, que buscava uma reaproximação de Feijó com o Palácio Piratini. No decorrer da conversa, Busatto fala abertamente que o PP se beneficiou com o Detran e o PMDB com o Banrisul, entre outras coisas. “Eu não ouvi todas as frases, pois a gravação estava ruim, mas o que ouvi é suficiente para afirmar que estamos diante de uma crise institucional inédita no Rio Grande do Sul”, sustentou o deputado Elvino Bohn Gass (PT).
O deputado Raul Pont (PT) desafiou o chefe Casa Civil a revelar à CPI quais as campanhas que foram financiadas pelo Detran e pelo DAER, órgãos públicos citados como fonte de financiamento dos partidos num trecho da gravação. “Se isto é verdade, o chefe da Casa Civil é réu confesso e estamos diante não só de um crime de corrupção, mas de um crime eleitoral também”, avaliou o líder do PT.

O diálogo

Apesar da má qualidade da gravação, os deputados que ouviram o áudio foram unânimes em considerar o material de altíssima gravidade. Em um trecho da conversa, Busatto tenta negociar com Paulo Feijó o apoio do vice às políticas do governo. Feijó responde que não quer cargos, apenas participar das decisões do Executivo porque foi eleito para isto. Busatto avança, diz que os partidos sobrevivem da máquina pública e cita o Detran, o Banrisul, o Daer e a CEEE. Feijó diz que não pode compactuar com as irregularidades no Detran, “assim como faz a governadora Yeda Crusius”, e que uma CPI do Banrisul seria positiva.
Minutos antes de começar a sessão da CPI, o vice-governador deu a seguinte declaração à imprensa: “Tenho a obrigação de tornar amplo este fato, é obrigação de homem público tornar estes fatos abertos e reais, e de forma transparente. Eu não posso dar respaldo a coisas de que eu tenho conhecimento. Vejo que nosso governo não tem agido com interesse de terminar com isso.

Confira o áudio em MP3

Confira a transcrição do diálogo entre Feijó e Busatto:


Feijó - Não é verdadeiro, isso aí.

Busatto - eu não acredito nisso.....

Feijó - no quê?

Busatto - este é o modus vivendi de .....

Feijó - não sei, não sei....

Busatto – ....essa guerra que está... e tu tenha elementos para abrir, concordo que isso cria uma situação muito ruim

Feijó – tá, e por isso eu vou dar suporte a tudo isso

Busatto - não, não Feijó, de maneira nenhuma......

Busatto - que possibilidade existiria de nós construirmos uma alternativa de entendimento, não no entendimento no sentido ... porque tem tanta coisa pendente porque tem um passivo que não resolve nunca mais, né, mas eu pergunto para evitar uma ruptura definitiva (...) se houvesse essa possibilidade que condições tu exigiria para isso?

Feijó - eu já disse desde o início não tem condição nenhuma eu só quero, como vice-governador, poder participar das decisões do governo, não quero cargo, não quero secretaria, então ah, eu demonstro que não tenho interesse, eu não tenho interesse por cargo por nomeação nem por secretaria nem por nada, mas eu quero participar, poder participar, eu não quero que as coisas sejam feitas de acordo com o que eu defendo, não, mas eu gostaria, como vice-governador, sentar numa mesa e discutir como a gente discute, ah, tomar a decisão em conjunto? É essa decisão. Agora, eu quero entender o seguinte: por que encobrir o Detran, se sabia que antes de eu entrar na política nós já sabíamos que havia esse esquema no Detran, todo mundo sabia, era público, por que não querer mudar? Desde 2003 eu sei que existe uma quadrilha no Banrisul, por que não querer mudar?

Busatto - por que quando do segundo turno como está sendo hoje com o Rigotto, conviveu com essas duas situações casualmente?

Feijó - Por que? Por que? Por que quem era eu Busatto? Por que não fui com o rigotto? Quem era eu? Era um empresário médio do rio grande do sul presidente da Federasul, eu vou bater de frente com o governador do Estado? Com o secretário do Estado? Que espaço eu tinha na mídia? Que respaldo eu tinha? Nenhum. Agora, hoje, eu me sinto responsável pelo governo que está aí, eu fui eleito junto com a governadora. Ela querendo ou não, ela gostando ou não, eu ajudei a eleger ela, ao menos um voto eu fiz para a chapa, eu trouxe recursos para campanha de amigos meus, empresários, que confiaram em nós, que confiaram no discurso de propriedade, de menos imposto, de menos governo, de menos secretaria, depois que nós passamos para o segundo turno deixa o Feijó lá isolado, ele que se rale, ninguém mais dê ouvido para ele, essa era a reciprocidade que eu tinha, a única coisa que eu sugeri, que eu não exigi, eu sugeri: olha, antes de nomear o presidente do banco eu gostaria de apresentar, ela não quis me ouvir, ela não tinha interesse nisso, então cada um que faça as suas interpretações porque ela não tinha interesse em mexer no Detran. Vamos pegar o Cairoli, se ele sabe alguma coisa do nosso governo que poder ele tem para enfrentar a mim e a governadora? Nenhum, como presidente da Federasul. Nenhum ou muito pouco, vamos dizer assim. Agora, como vice-governador eu tenho obrigação e eu não vou ficar quieto enquanto não mudar ou não demonstrar que nós estamos aqui para fazer o que tem que ser feito.

Busatto - ... tenho bastante convicção nisso. A governadora (ininteligível), eu acho que .. eu sinto muito isso em Porto Alegre, um pequeno partido se ganha uma eleição dessas precisa governar com maioria para poder viabilizar seu governo que é um pouco caso (...) que nunca governou o Estado.

Feijó - sim, não tem base partidária na assembléia.

Busatto – acaba tendo que fazer concessões importantes, os partidos aliados, os partidos grandes do Estado

Feijó - eu não tenho dúvida disso

Busatto - tanto o Banrisul quanto o Detran

Feijó - são os dois maiores, fora o PT

Busatto - tu concorda que são PMDB e PP, né?

Feijó - claro,

Busatto - então não podemos deixar eles fora. Não tenho dúvida de que o Detran é uma grande fonte de financiamento.

Feijó - do PP?

Busatto - isso não é verdade? e o Banrisul, nos últimos 4 anos, com certeza, eu até acho que de repente a governadora poderia até (ininteligível) pensado nisso, né, mas eu te digo uma coisa: os dois partidos (ininteligível) do Estado como é que isso isso ia ficar insustentável.

Feijó - hum, hum

Busatto - então assim eu não creio que a governadora seria totalmente responsável por tudo isso, tu entende? Quer dizer vai .....

Feijó - sim, então é melhor deixar assim então?

Busatto - e outra coisa: o custo que teria ter que romper com o Zé Otávio (ininteligível)

Feijó - sim, pra mim tá claro, ela rompeu comigo e se abraçou no simon na época lá quando ela pediu para que eu renunciasse

Busatto - é, é, eu quero dizer o seguinte: é difícil (ininteligível) ser só maldade dela... esse jogo.

Feijó - agora eu te pergunto o seguinte:

Busatto- (ininteligível)

Feijó - eu entendo, eu entendo. Agora te pergunto o seguinte...

Busatto - se tu tivesse sentado naquela cadeira e .. se eu não tiver 30 votos, 27 votos, 28 votos na Assembléia eu não governo, entende? É uma opção difícil.

Feijó - ok, politicamente, eu concordo, agora, não posso ser conivente com isso não numa questão política, mas numa questão de roubo, desvio, não pode, e ela está sendo. Por questões políticas? Não sei, por interesse financeiro? Não sei. Ou pelos dois juntos.

Busatto - ... se misturar, tu sabe que essa comunhão legislativa não funciona, muitos entraves...

Feijó - eu sei

Busatto – (ininteligível) nesse assunto... e o PDT...

Feijó – Oh, Busatto, eu tô num mundo que não é meu, e eu não me acostumo com isso

Busatto - (ininteligível) tu essencialmente está certo. Te digo assim: (ininteligível) faria se tivesse inviabilizado... isso uma hora se torna insuportável (inintligível) tá doente, tá doente... no sentido que vai ficar uma contradição... tua consciência (ininteligível) tu tá (ininteligível) o Serra ... não quero nem entrar no mérito dela... eu sei que tem desculpa embora a lógica da política ela é cruel... eu não sei se ela não mudará... tão cedo... Ministério Público... não sei se é uma boa saída, aliás, eu não sei se tem como sair... (ininteligível)... eu acho assim, Paulo, não é posição só da Yeda... todos os governadores só chegaram aí com fonte de financiamento ou de Detran, do Daer.. quantos anos o Daer sustentou...

Feijó - não sei

Busatto - Na época das obras... fortunas, depois foi o Banrisul...

Feijó - Na CEEE

Busatto - Na CEEE, se tu vai ver...

Feijó – é onde rendia... é onde os grandes partidos estão... não quero saber... é onde tem as possibilidades de financiamento, pode ter certeza de que tem interesses bem poderosos aí controlando (ininteligível) ...

Busatto - é uma coisa mais profunda que está em jogo... eu não sei se em alguns lugares se superou isso, acho que sim, né? Países mais avançados... mais maduras, norte da Europa, enfim tem lugares em que a atividade pública é mal remunerada

Feijó - sim, por idealismo

Busatto - por idealismo, por voluntariado, as pessoas não deixam de trabalhar, tu é deputado, tu não deixa de ser advogado, tu vai.como advogado, tu dedica... mas aí... na Europa... mas aqui nós estamos muito mal nisso...

Feijó - tá na hora de começar a mudar, em Busatto? Mas qual é tua proposição?

Busatto - não tem nada concreto..(ininteligível) ... a tua decisão, tu tens razões para isso, se pudessémos encontrar um modus vivendi que nos permitisse tu não romper com tuas convicções ... para tu estar dizendo pra ti mesmo, pra tua consciência... qual é o custo disso? Eu não sei. de repente o Fernando faz um gesto concreto para ti, não quero pensar alto porque isso não tá no horizonte acho que tanto a ver uma coisa concreta que pudesse permitir ou outra coisa, quem sabe? ... (ininteligível) ... acho que eu estaria disposto a contar sei que a governadora é muito complicada, mas, se não for assim, ... agüenta esse sofrimento, se tu não vai abrir mão das tuas convicções ... (ininteligível) ... tu tem informações ... ela vai pagar um preço alto por isso, talvez mais que ela merecesse se tu for ver ... Rigotto, Olívio, Britto ... cada um tem o seu jeito de financiar as coisas, então eu acho que... então eu queria te consultar se tem um caminho que o governo.... eu gostaria de tentar... não posso dizer assim, ah, não deu certo

Feijó - eu sempre tive a disposição para contribuir. Agora estou extremanente incomodado com tudo isso, não é nada do que eu esperava dessa atividade política, to aberto aí para qualquer proposição ou uma demonstração efetiva de que é pra valer, não é pra fazer de conta

Busatto - por exemplo, assim, uma coisa que me preocupa muito (ininteligível)

Feijó - sabe uma coisa? Eu sempre defendi a federalização e não a privatização do banco

Busatto - ... a Nossa Caixa, o Serra tá vendendo a Nossa Caixa para o Banco do Brasil.

Feijó - eu sei, mas tu sabe que o Aod, agora em março, abril, teve aqui falando comigo e veio me perguntar: oh, Feijó hoje avaliando a questão do banco é insustentável a médio prazo, eu sou até favorável.

Busatto - desde 2002, quando termina as consignações é o que sustenta ...

Feijó – (Aod) eu apoiaria um projeto desses. Eu sou favorável, tu apoiaria um projeto desses? E eu digo: eu sempre apoiei, Aod. É porque eu estou convencido, me disse o Aod, eu só tenho uma coisa, eu e a governadora nos comprometemos a não fazer isso no nosso governo, então eu vou cumprir com o que eu defendi em campanha, eu me lembro que nós tivemos lá no PSDB, lá no comitê uma reunião com os diretores, com os gerentes de banco e nos comprometemos... então como é que nós vamos defender o contrário? Aod: Ah, nos impostos nós já fizemos o contrário. Aí eu disse: então tá tri, tu levanta essa bandeira que eu não vou levantar. Agora eu concordo que o banco vender uma participação na Serasa e que isso que deu resultado pro teve, não é?

Busatto - Serasa do ...

Feijó - é o Serasa, o Banrisul tinha uma participação no Serasa, ele e outros bancos, me parecesse que foi bastante expressivo o valor apurado, poi, oh,Busatto tu tem muito mais expeiência e visão do que eu.

Busatto – ...é muito complexo de fazer, mas eu gostaria de encontrar formas, então de resolver, né, para que pudesse te dar conforto, criasse um modus vivendi porque eu acho uma loucura o que nós estamos fazendo, é sui generis essa situação fica insustentável ... pode acabar numa puta crise

Feijó - agora eu tenho a convicção se sair uma CPI do Banrisul seria muito bom para a sociedade, não tenho dúvida disso, politicamente não sei avaliar, agora, em termos de chegar à realidade do banco e ver efetivamente se nós, Rio Grande do Sul, precisamos estar pagando esse custo para manter um banco, afinal Santa Catarina não tem banco, Paraná não tem banco, São Paulo não tem Banco, Rio não tem banco, Bahia, nenhum estado representativo tem banco...

Busatto - .... não sei se uma CPI... o prazo é 2011, não é... são 300 mil clientes ativos ...

Feijó - mas eu to aberto, tá Busatto, aguardo uma sinalização

Busatto – vou pensar com muito carinho .... hoje o Sossella pediu a tua convocação para a CPI

Feijó - é, é, o Marquinho me ligou quando eu tava vindo da CEEE. Eu liguei para o Marquinho e pedi que ele fizesse aquela intervenção ...

Busatto .... que te convoque, né.

Feijó - inclusive o presidente da CPI, o Fabiano, quarta-feira, antes de eu viajar...eu tô com investimento lá em Punta Del Leste ....ele me disse olha, vai lá, medita, vamos conversar. Aí o Fabiano disse: se tu vai me convencer que eu tenho algo a agregar, tu me faça um convite que eu vou lá. O Fabiano ficou de me ligar. Aí até me surpreendeu hoje a posição do Sossella.

Busatto – O Sossella ... Paulo Azeredo... então tá, eu vou pensar no que nós conversamos e voltamos a conversar, ok?

Feijó - Ok.

Busatto - obrigado pela tua ajuda.

Feijó - eu tô sempre aberto.

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