Zillah Branco*
A linguagem que hoje desperta a confiança popular é a de Lula quando diz que “esta crise é do Bush” e se deve ao fato “das grandes instituições financeiras viverem da especulação e da agiotagem”, ou a de Evo Morales que explica porque “expulsou o embaixador norte americano que promoveu os disturbio na Bolívia”.
A midia no Brasil tenta ridicularizar os conceitos populares do nosso Presidente citando as frases confusas em economês que Meireles usa para justificar a posição do Banco Central autônoma face ao governo brasileiro e omite as palavras de Evo. A técnica é antiga, de falar difícil e desprestigiar quem não é (e não quer ser) da elite reinante e, simplesmente, ignorar e apagar da comunicação social o que não aprecia. Assim entendem a “liberdade de expressão”. Mas os tempos são outros, graças a Deus, talvez.Há muitos anos bons economistas têm demonstrado que as finanças têm-se tornado o cerne das políticas economicas globalizadas. Mesmo um leigo pode verificar que enquanto cresce o desemprego e aumenta o custo de vida em todo o mundo, mesmo no Brasil onde o governo Lula se esforça por tirar a população da miséria, os bancos e empresas imobiliárias e de seguro multiplicam anualmente os seus lucros milionários. Só a midia tenta tapar o sol com a peneira para que não se compreenda porquê a renda está cada vez mais mal distribuida.
Agora, ficou claro para toda a gente. Até os deputados mais reacionários dos Estados Unidos foram contra a proposta inicial de Bush para salvar os seus parceiros das finanças com o dinheiro público! E no dia 8 de Outubro, até a Globo referiu a “herança maldita de Bush”. Quando a dor chega ao bolso, desperta a lucidez dos mais renitentes defensores do sistema capitalista.
Fica claro também que há uma linguagem utilizada pela elite mundial destinada a parecer democrática mesmo quando efetivamente é reacionária, isto é, defensora dos privilégios da elite às custas do sacrifício popular.
Vivemos uma época em que os velhos preconceitos – de raça, de classe, de religião, de ideologia – estão em extinção graças ao surgimento de uma linguagem transparente que desnuda os conceitos antes escondidos nas suas diferentes estruturas acadêmicas. Por isso a linguagem popular, mesmo com erros gramaticais ou outros formais, traduz melhor a realidade da vida em sociedade. Lula pergunta: “Cadê o FMI agora para explicar a crise? (...) Antes dava palpite para denunciar erros nas politicas nacionais, recomendando isto e aquilo ..”
Quem leu anteriormente o livro “Chutando a escada”, do economista Ha-Joon Chang, já pode perceber que os conselhos do FMI aos paises em desenvolvimento eram para cairem da escada que levava os mais ricos ao poder mundial. E a escada, sustentada pelo sistema financeiro, afinal despencou levando os Estados Unidos e todos os que se atrelam ao poder capitalista, para uma crise tremenda. “Cadê o FMI com os seus conselhos errados”? Está agora como um velho sismógrafo apenas indicando o gráu do desastre para cada país: os Estados Unidos terão um crescimento de 0,1%, o Brasil de 3 ou 3,5% no próximo ano.
Porquê o Brasil recebe as “marolas” do “tsunami” que arrebentou com a economia da super-potência? (como bem disse Lula na sua linguagem clara com figuras que o povo entende). Porquê, apesar do país estar se equilibrando no sistema capitalista global, sacrificado financeiramente pelos esforços do Banco Central autonomo que sobe os juros, como convém ao mercado internacional, e agora empresta dolares (de alto valor em real) aos bancos estrangeiros que investem no Brasil para depois recebe-los com valor menor (como fazem os bons irmãos na hora do aperto geral), a orientação de Lula assegurou ao país que a produção fosse estimulada e os investimentos nos Programs de Aceleração para o Crescimento (PAC) continuassem assim como a distribuição dos socorros das bolsas de alimentação e de escola para as crianças que asseguram as condições mínimas de sobrevivência à população empobrecida pelos anteriores conselhos do FMI que exauriram a economia do Terceiro Mundo. O povo brasileiro permaneceu com os pés na terra, realisticamente enfrentando a vida dura como deve.
Quando a história é contada sem disfarces empolados do economês, fica clara a possibilidade de manter o caminho de desenvolvimento e da dignidade nacional dentro do charco do sistema capitalista para os que “não chutam a escada” como recomendou sempre o FMI. O Brasil manteve o nariz fora da lama e tudo tem feito para dar o exemplo ao Terceiro Mundo através das iniciativas no Mercosul e nos vários encontros internacionais como na última sessão da ONU em Nova York. Assim é o equilíbrio, que pode ser explicado em linguagem popular que é a mais própria.
A Bolívia tem usado uma linguagem clara para mostrar o esforça que desenvolve para equilibrar uma das economias mais empobrecidas do mundo neste sitema sugador capitalista, mas a mídia não divulga nem lá e muito menos cá e para o resto da humanidade. Evo Morales e seus companheiros traduzem para o castelhano em forma popular o que aprenderam em aymara e quetchua há mais de mil anos: como produzir em elevadíssimas altitudes com muito frio à noite e muito calor durante o dia para alimentar os seus nove milhões de habitantes mantendo a independência do país e uma cultura humanizada que conduz a sociedade pelo caminho democrático. Assim será o equilíbrio para que o país onde foram criadas mais de uma centena de variedades de milho e batata que mataram a fome dos demais paises, principalmente da Europa em períodos de crise alimentar, volte a ser auto-sustentável e a poder explorar as suas riquezas minerais que nos últimos 500 enriqueceu os colonizadores, antigos e modernos.
Vivemos um rico período histórico que favorece as mudanças na medida em que os que lutam pela independencia e pela dignidade nacionais se apoiem mutuamente. Os grandes senhores da guerra estão ocupados contando os tostões que lhes escapam das bolsas e tentando demonstrar aos seus próprios eleitores que são democráticos e humanizados. Felizmente não estão em condições de interferir na corrida para o desenvolvimento que os paises mais pobres são capazes de conduzir com palavras claras e conceitos transparentes. É uma belíssima maratona mundial de todo o Terceiro Mundo que a elite tenta dizer que não existe.
*Zillah Branco, formada em Ciências Sociais (USP), experiência de vida e trabalho no Chile,Portugal e Cabo Verde,colaboradora do jornal O Avante (PCP).
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