Inquérito da Polícia Federal conclui que o ministro do Supremo Tribunal Federal não teve seu telefone grampeado durante a operação Satiagraha, ao contrário do que ele próprio denunciara. Por Wálter Maierovitch, CartaCapital
–1. Todos lembram da indignação do ministro Gilmar Mendes no papel de vítima de ilegal escuta telefônica, que tinha como pano de fundo a Operação Satiagraha.
Gilmar Mendes parecia possuído da ira de Cristo quando expulsou os vendilhões do templo.A fundamental diferença é que a ira de Mendes não tinha nada de santa.
Ao contrário, estava sustentada numa farsa. Ou melhor, num grampo que não houve, conforme acaba de concluir a Polícia Federal, em longa e apurada investigação.
–2. À época e levianamente ( o ministro fez afirmações sem estar na posse da prova materialidade, isto é, da existência do grampo), Mendes sustentou, –do alto do cargo de presidente do Supremo Tribunal Federal–, ter sido “grampeada” uma conversa sua com o senador Demóstenes Torres.
Mais ainda, o ministro Mendes e o senador da República, procurados revista Veja confirmaram o teor da conversa telefônica, ou melhor, aquilo fora tratado e que só os dois pensavam saber.
–3. Numa prova de fraqueza e posto de lado o sentimento de Justiça, o presidente Lula acalmou o ministro e presidente Gilmar Mendes. Ofertou-lhe e foi aceita a pedida cabeça do honrado delegado Paulo Lacerda, então diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abim).
Em outras palavras e para usar uma expressão popular, o competente e correto delegado Paulo Lacerda acabou jogado ao mar por Lula. E restou “exilado”, –pelos bons serviços quando esteve à frente da Polícia Federal (primeiro mandato de Lula)–, na embaixada do Brasil em Lisboa. Pelo que me contou o ex-ministro Márcio Thomaz Bastos, o delegado Lacerda, no momento, está no Brasil. Apenas para o Natal e passagem de ano com a família.
Conforme sustentado à época, — e Lula acreditou apesar da negativa de Paulo Lacerda–, a gravação da conversa foi feita por agente não identificado da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). E o ministro Nelson Jobim emprestou triste colaboração no episódio, a reforçar a tese de interceptação e gravação. Mendes e Jobim exigiram a demissão de Paulo Lacerda.
“Vivemos num estado policialesco”, repetiu o ministro Gilmar Mendes milhares de vezes e dizendo-se preocupado com o desrespeito aos pilares constitucionais de sustentação ao Estado de Direito.
O banqueiro Daniel Dantas, por seus defensores, aproveitou o “clima” e, como Gilmar e o senador Torres, vestiu panos de vítima de abusos e perseguições ilegais, com a participação da Abin em apoio às investigações do delegado Protógenes Queiroz.
Parênteses : Dantas é um homem muito sensível. Está a processar e exigir indenização pecuniária do portal Terra por “ironias” violadoras do seu patrimônio ético-moral. Lógico, todas ironias escritas por mim (Walter Fanganiello Maierovitch), no blog Sem Fronteiras.
–4. O grampo sem áudio serviu de pretexto para o estardalhaço protagonizado pelo ministro Gilmar Mendes.
Um estardalhaço sem causa, pois, para a Polícia Federal, nunca houve o grampo descrito nas acusações de Mendes e em face de matéria publicada revista Veja. A revista, até agora, não apresentou o áudio, que é a prova da existência material do crime de interceptação ilegal.
Gilmar Mendes, –com a precipitação e por cobrar providências–, esqueceu o disposto no artigo 340 do Código Penal Brasileiro, em dispositivo que é também contemplado no Código Penal da Alemanha, onde Mendes se especializou: art.340: “ Provocar a ação da autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime ou contravenção que sabe não se ter verificado”.
Trata-se de crime previsto em capítulo do Código Penal com a seguinte rubrica “Dos Crimes Contra a Administração da Justiça”.
Com efeito. Uma pergunta que não quer calar: será que um magistrado pode provocar a ação da autoridade sem prova mínima da existência de um crime ? Cadê o áudio que foi dado como existente ?
A conclusão do inquérito policial será encaminhada ao ministério Público, que deverá analisar a conduta de Mendes, à luz do artigo 340 do Código Penal.
Sua precipitação, dolosa ou não, não será apreciada pelo Conselho Nacional de Justiça, dado como órgão corregedor e fiscalizador da Magistratura.
Nenhum ministro do STF está sujeito ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), como se nota, um órgão capenga no que toca a ser considerado como de controle externo da Magistratura (menos o STF).
Viva o Brasil.
Walter Maierovitch é jurista e professor, foi desembargador no TJ-SP
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