segunda-feira, 28 de abril de 2008

Duvide do Inter

Como colorado de muitas décadas, sinto obrigação de publicar o texto de outro torcedor do Inter. É maravilhoso, sarcástico e uma espécie de chamamento à torcida colorada para o jogo de domingo contra o Juventude. Um confissão ao Andreas: para quem me perguntar, eu vou dizer que duvido. Mas, lá no fundo da alma, eu confio sempre.


Andreas Müller

Você aí: duvide do Inter. Sim, duvide, vá em frente, aproveite o momento e desabafe. Livre-se da imensa carga de frustração que abateu seu coração ao final da partida contra o Juventude, neste domingo. Vamos lá, duvide, dê-se por vencido. Leve as mãos à cabeça, puxe os próprios cabelos, chute o cachorro e despeje todo o seu vocabulário de xingamentos em Abelão e, principalmente, em Fernandão. Assim não dá! Assim não pode! E quem foi que disse que o Fernandão é craque? Que é ídolo? Pois ontem ele mais parecia um dublê de Leandro Guerreiro... Viu só? Você está pegando o espírito! Vamos lá, duvide do Inter.

Duvide, mas seja pragmático. Concentre-se nos fatos. Lembre-se que o Inter já enfrentou o Juventude três vezes neste ano e perdeu todas. Pior ainda, não conseguiu marcar um único gol. Na soma dos três confrontos, é como se estivéssemos sofrendo uma goleada de 5 x 0. A superioridade alvi-verde, portanto, é indiscutível. É um fato. O Juventude não é apenas favorito ao título regional de 2008: ele praticamente já o ganhou. O jogo de volta será apenas protocolar. Quase 50 mil colorados se amontoarão nas arquibancadas do Beira Rio para testemunhar o inevitável triunfo juventudista. O Inter se rendeu à máquina alvi-verde. Já era.
Ah, você é gremista? Então deleite-se, caro rival. Nós, colorados, estamos perdidos! Agora, o momento é todo seu. Vamos lá, sorria! Tripudie em cima dessa touca verde que teima cobrir nossas cabeças inchadas. O fracasso colorado é iminente – e vai tornar as suas férias forçadas um pouco menos dolorosas. Você, gremista, é um cara sensato. Você tem os pés no chão. No fundo, você sabe que a derrota do Inter, no próximo domingo, será o dia mais feliz deste seu desgraçado 2008. Você tem mais é que comemorar. Então vá lá: duvide do Inter. A sua festa já tem data para começar: próximo domingo, 16h. Duvide, é o que eu lhe peço.

Porque o seu pessimismo é a nossa última esperança.

Quase todas as torcidas do planeta sofrem (ou já sofreram) da síndrome do “já ganhou”. Mas nós, colorados, somos diferentes. Nós também apresentamos, às vezes, o lado oposto desse otimismo descabido – um inexplicável clima de “já perdeu”. São crises aterradoras de pessimismo que nos acometem nesses momentos em que tudo parece conspirar contra. Um Barcelona invicto, que aplica uma ciranda num time mexicano, é um dos fatores capazes de nos fazer submergir na desgraça antecipada. Um São Paulo tricampeão mundial, que nunca perde jogos decisivos no Morumbi, idem. E não precisamos nos restringir somente às finais de campeonatos. Às vezes, basta um gol sorrateiro do Paraná logo no segundo minuto de jogo para que o drama do “já perdeu” venha à tona. E aí a casa cai. Nós jogamos a toalha, damo-nos por vencidos. Nós duvidamos do Inter.

O curioso é que, justamente nestes momentos, o Inter cresce. Quando todos estão convencidos de que “já era“, a mística do Saci reaparece em campo e o Inter, literalmente, prega uma peça no adversário. Tem sido assim ao longo da história colorada. O Inter desacreditado é sempre mais poderoso do que o Inter favorito. Se passamos toda a década de 80 sem ganhar títulos de grande expressão, foi porque ainda estávamos deslumbrados com aquele Inter de Falcão e Figueroa, que pisava no gramado apenas para cumprir o script de vitórias inevitáveis. Nós tínhamos certeza de que ganharíamos o Brasileirão de 1987. Nós tínhamos certeza de que superaríamos as macumbas de Bobô naquela final de 1989. Nós tínhamos certeza de que passaríamos do Olímpia naquela Libertadores maldita. Mas a mística do Saci é cruel. Naquelas ocasiões, nós mesmos éramos vítimas de suas peças.

Por isso, eu imploro: duvide do Inter. Tenha absoluta certeza de que o título gaúcho já é do Juventude. Reclame de Fernandão, da inconstância de Abelão, das canelas de vidro de Alex e do cabelo do Nilmar – a falta de gols só pode ser obra e graça daquela franja que lhe cobre os olhos. Duvide do Inter com todas as suas forças. Mas, só por segurança, garante o seu lugar nas arquibancadas do Gigante no próximo domingo. Esteja lá, ignore as desconfianças e apóie o time o tempo inteiro, só por “amor à camiseta” – que é como a turma dos otimistas se refere ao masoquismo. Na volta, é bem provável que lhe perguntem:

— E aí, tu acha que ainda tem lugar para estacionar lá na Goethe?

Você olhará o trânsito, o congestionamento de bandeiras, as pequenas multidões que se formam nas sinaleiras. E responderá com o pragmatismo habitual:

— Duvido. A essa hora, já era.