quinta-feira, 26 de março de 2009

Associação de Juízes chama Gilmar Mendes de leviano

A Associação dos Juízes Federais do Brasil emitiu uma dura nota contra declarações do presidente do STF, Gilmar Mendes, na sabatina de quarta-feira na Folha.

Leia a íntegra, que retirei do blog do Fernando Rodrigues.

A Associação dos Juízes Federais do Brasil – AJUFE, entidade de âmbito nacional da magistratura federal, vem a público manifestar sua veemente discordância em relação à afirmação feita pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, que, ao participar de sabatina promovida pelo jornal “Folha de S. Paulo”, disse que, ao ser decretada, pela segunda vez, a prisão do banqueiro Daniel Dantas, houve uma tentativa de desmoralizar-se o Supremo Tribunal Federal e que (sic) “houve uma reunião de juízes que intimidaram os desembargadores a não conceder habeas corpus”.

Conquanto se reconheça ao ministro o direito de expressar livremente sua opinião, essas afirmações são desrespeitosas aos juízes de primeiro grau de São Paulo, aos desembargadores do Tribunal Regional Federal da Terceira Região e também a um ministro do Supremo Tribunal Federal.

Com efeito, é imperioso lembrar que, ao julgar o habeas corpus impetrado no Supremo Tribunal Federal em favor do banqueiro Daniel Dantas, um dos membros dessa Corte, o ministro Marco Aurélio, negou a ordem, reconhecendo a existência de fundamento para a decretação da prisão. Não se pode dizer que, ao assim decidir, esse ministro, um dos mais antigos da Corte, o tenha feito para desmoralizá-la. Portanto, rejeita-se com veemência essa lamentável afirmação.

No que toca à afirmação de que juízes se reuniram e intimidaram desembargadores a não conceder habeas corpus, a afirmação não só é desrespeitosa, mas também ofensiva. Em primeiro lugar porque atribui a juízes um poder que não possuem, o de intimidar membros de tribunal. Em segundo lugar porque diminui a capacidade de discernimento dos membros do tribunal, que estariam sujeitos a (sic) “intimidação” por parte de juízes.

Não se sabe como o ministro teria tido conhecimento de qualquer reunião, mas sem dúvida alguma está ele novamente sendo veículo de maledicências. Não é esta a hora para tratar do tema da reunião, mas em nenhum momento, repita-se, em nenhum momento, qualquer juiz tentou intimidar qualquer desembargador. É leviano afirmar o contrário.

Se o ministro reconhece, como o fez ao ser sabatinado, que suas manifestações servem de orientação em razão de seu papel político e institucional de presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, deve reconhecer também que suas afirmações devem ser feitas com a máxima responsabilidade.

Brasília, 24 de março de 2009.
Fernando Cesar Baptista de Mattos
Presidente da AJUFE

SOU JORNALISTA POR FORMAÇÃO

Márcia Martins (*)

O 1º de abril, marcado no calendário mundial como o Dia dos Bobos, começou a ganhar fama no Brasil, em Pernambuco, em 1848, quando ocorreu o lançamento do jornal "A Mentira", informando a morte de Dom Pedro, desmentida no dia seguinte. De vida breve, o periódico saiu pela última vez em 14 de setembro de 1849, convocando seus credores para o acerto de contas no dia 1º de abril de 1850, num local inexistente. E desde então, atire a primeira pedra quem nunca aplicou uma pequena mentira e se justificou, depois, dizendo que era "brincadeira de 1º de abril".

Em nome da informação qualificada, de um jornalismo democrático, exercido com responsabilidade e ética, é que os jornalistas de todo o Brasil precisam unir-se em defesa da exigência do diploma como requisito para o exercício da profissão. E evitar que três séculos depois, o dia 1º de abril fique conhecido como a data em que o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a extinção da profissão do jornalista. E na carona, o fechamento de milhares de cursos de comunicação no País. O desespero de universitários que sairão formados em coisa nenhuma. A informação não apurada para a sociedade.

Ao julgar o Recurso Extraordinário sobre a constitucionalidade da exigência do diploma em curso específico para exercer a profissão de jornalista, o STF ameaça uma das conquistas mais importantes da sociedade: o direito à informação independente e plural. A formação superior é uma conquista dos jornalistas, depois de 70 anos da regulamentação da profissão e mais de 40 anos da criação dos cursos de Jornalismo. Na prática, a não obrigatoriedade do diploma significa que qualquer pessoa, mesmo sem terminar o Ensino Fundamental, pode exercer as atividades jornalísticas.

Mais do que um retrocesso perigoso na democracia e na qualidade da informação, a decisão do STF pode abrir um precedente irreversível direcionado a outras profissões que exigem nível superior. E se um belo dia, uma juíza, do alto de seu saber teórico e notório, fechada no seu gabinete, entender que não é preciso ter formação superior para ser assistente social, nutricionista, fisioterapeuta, enfermeira e outras profissões? Vamos assistir tudo de braços cruzados? E deixar que decidam por nós quais as profissões exigem um aprendizado apurado?

Não se trata, apenas, de uma luta corporativista, como alguns podem julgar, a preocupação das entidades de trabalhadores de jornalistas com a sessão do STF no dia 1º de abril. É a inconformidade com a perda de um direito que todo cidadão brasileiro tem de receber informação apurada por profissionais capacitados, com formação teórica, técnica e ética. É a punhalada que pode ferir a liberdade de expressão e comprometer, no futuro, a continuidade de inúmeras outras profissões. É a não repetição de mentiras como a morte de Dom Pedro e nem a invenção de locais inexistentes para receber dívidas.

Resta acreditar que o bom senso irá prevalecer e que o País seguirá na trilha de um jornalismo profissional em aperfeiçoamento, para melhor informar a sociedade. Pedir que Hugo de Grenobble, Venâncio, Ludovico, Valério, Teodora, Teodorico e Pavoni, os santos de 1º de abril, iluminem os ministros do STF. E que a história, narrada no poema do fluminense Eduardo Alves da Costa, não encontre amparo na decisão do STF: "... Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada".



(*Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela PUCRS, trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou carreira profissional, na Zero Hora, em assessorias de comunicação sociais empresariais e públicas e está licenciada do Correio do Povo. É poeta, diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS. E tem o blog marcinhaprodigio.blogspot.com)